quarta-feira, 11 de julho de 2012

Não quero ser musa!


Eu sou a heroína dessa história,
eu não preciso ser salva.

Independentemente do acontecimento, se há mulheres envolvidas, a mídia dá um jeito de eleger uma musa. A musa está em todas as pautas: há a musa do futebol, a musa do basquete, a musa dos bandeirinhas, a musa do rock, a musa do Congresso Nacional e até a musa de manifestação feminista.

Ser chamada de musa, embora pareça um elogio, colabora com a manutenção das mulheres no lugar estipulado para elas pelo patriarcado, ou seja, reafirma que a mulher pode até ser cientista, política, professora, atleta, ativista, mas o que importa é que ela seja bonita, um enfeite. A principal função feminina é embelezar o ambiente. Ser uma boa profissional, ser idealista e lutar pelo que acredita não importa, importa se ela está dentro do padrão de beleza e se os homens héteros a acham atraente.

Destaca-se que a palavra musa também carrega em seu significado a capacidade da mulher "dona" desse título de inspirar a produção intelectual de quem a admira. A sociedade (que supõe que mulheres só se relacionam com homens) coloca a mulher tão inferior ao homem que considera que ela não produz, o máximo que ela pode fazer é auxiliar a produção de conhecimento e arte sendo um "colírio" ao olhar masculino.

 Além disso, a autoestima feminina é detonada pelas contínuas cobranças para estar dentro de um padrão de beleza fantasioso e excludente. A possibilidade de ser considerada uma musa é uma cobrança acessória do próprio padrão de beleza que se fantasia de "prêmio". Ser musa é ter um combo de "qualidades" para o patriarcado, ser bonita e ter a capacidade de inspirador o outro. Esse combo de cobranças alimenta essa fantasia de querer ser linda, musa, diva, gerando infelicidade e frustração em mulheres de todas as idades. 

Não posso ser a mulher da sua vida porque já
sou a mulher da minha.
 Uma amostra de como a representação das mulheres na mídia reduz o gênero feminino a enfeite são as reportagens sobre a eleição de 2010 e suas críticas ferrenhas ao visual da Dilma e a ausência de comentários do mesmo assunto sobre o Serra. O documentário "Miss represetation" fala mais sobre como a mídia trabalha com a imagem feminina, a análise parte da realidade norte americana. É perceptível pelo vídeo que o tratamento midiático dado às mulheres vai além da redução a mero objeto, mas também há uma tentativa de sempre criticar e desvalorizar mulheres que saem fora do papel de gênero, pela sua função ou pela sua imagem. Em um dos primeiros minutos do documentário é possível perceber como a mídia não leva as mulheres a sério. Mesmo as mulheres mais poderosas dos EUA tem sua intimidade invadida e discutida com frases como "será que ela fez uma plástica?" ou então se a mulher demonstra um pulso mais firme pra tratar de uma questão, pronto, a atitude dela produz um apelido sensacionalista e com conotação sexual, "dominatrix". 

Bom, fazendo um paralelo com o que foi falado, pode-se trazer isso para o Brasil, a imagem da Dilma foi muitas vezes "amaciada" com o uso de sua presença em programas como o da Ana Maria Braga, que é considerado "feminino". Durante uma reportagem do Fantástico feita pela Patrícia Poeta, houve perguntas bem pessoais, a respeito até mesmo sobre os netos e sobre a rotina "feminina" da presidenta. Ao mesmo tempo que vejo essas reportagens como uma possibilidade de se aproximar do público, conquistar eleitores e afins por parte da Dilma, vejo que a mídia trata essa "aproximação com os ideais de feminilidade" como uma forma de "colocá-la" no lugar e mostrar para as mulheres que mesmo ela, mulher poderosa, ainda gosta de cuidar da casa e da família, reafirmando assim os papéis de gênero. E mesmo o uso desse tipo de programa como uma possibilidade de se aproximar do público mostra como a sociedade é machista, se uma mulher num cargo político se mostra pouco feminina, ela tem que mostrar que não é bem assim e que ela preserva a feminilidade dela de alguma forma pra assim conseguir respeito e possibilidade de ser eleita. Ainda sobre o mesmo assunto, a gente vê que a mídia sempre faz perguntas sobre vaidade, família e afins para mulheres em cargos tipicamente masculinos. "Como faz pra manter a feminilidade num ambiente desses?" é a pergunta padrão.

‎No caso das atletas, a invisibilidade do esporte feminino coloca essas mulheres como vítimas ainda maiores dessa objetificação, visto que essa forma de tratamento da mídia coloca o título de musa como uma das únicas formas de visibilidade. Assim, o tratamento da mídia condiciona os patrocínios e a própria valorização do esporte ao uso de roupas que exibem as formas das atletas e que são "femininas".

Eu não sou feminista, mas ficar aqui sendo um objeto decorativo é um pouco chato.
Na verdade, eu realmente sou uma feminista.
 Enfim, a valorização da mulher na sociedade depende da aparência dela, da capacidade de atrair olhares de desejo e aprovação dos homens héteros, e também depende de quão "feminina" a mulher é. A capacidade feminina para o trabalho, para os estudos ou para qualquer coisa que fuja do tradicional é desacreditada pela mídia de diversas formas, ou reduzindo as mulheres à coisa, incluindo aqui críticas com denotação sexual, como o "dominatrix" ou através de comentários que sempre reafirmam que o lugar de mulher não é o que ela quiser, mas o que o patriarcado quer. 

O patriarcado e o capitalismo tem uma parceria que "vende" a mulher segura e bem sucedida, como uma mulher que é mãe, dona de casa e sua profissão e tudo isso sempre bem arrumada, vinculando a vaidade à autoconfiança e à capacidade. Uma mulher não arrumada, é uma mulher que sem valor para o mercado de trabalho (e para toda a sociedade). E enquanto isso, a autoestima feminina só perde.

6 comentários:

  1. rachei com essa bolinha de natal feminista <3

    cara, a midia é foda. "musa da cpi", "gangue das loiras", "gangue das gordas". sério, gente, é foda. nunca vi GANGUE masculina chamada "gangue dos magrelos" ou "gangue dos oxigenados".

    mais um texto maravilhoso do blog <3

    ResponderExcluir
  2. amei o texto e isso me lembrou essa reportagem que achei quase sem querer.

    http://virgula.uol.com.br/ver/noticia/esporte/2012/07/11/304161-musa-da-selecao-de-volei-jaqueline-nao-quer-ficar-conhecida-pela-beleza

    Mari

    ResponderExcluir
  3. O documentário Miss Representation foi retirado do youtube! Que pena!

    Se vocês arrumarem outro link, editem ai pra gente!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Achei um link novo e editei o texto com ele!

      http://vimeo.com/37703485

      Excluir
  4. Isso é reflexo da cultura patriarcal, onde o Feminino foi enterrado pra dentro do nosso inconsciente, lá pro submundo... Precisamos despertar como indivíduos ao invés de representar papéis arquetípicos de gênero e assim construirmos uma sociedade mais igualitária , pacífica e justa, onde as mulheres tenham participação e decidam igualitariamente com os homens.

    ResponderExcluir